O Código de Defesa do Consumidor foi criado em 1991 com o objetivo de estabelecer e normalizar assuntos referentes ao direito do consumidor, antes da internet se tornar popular e acessível a todos.
Em 2013, um Decreto Federal veio para regulamentar algumas questões relativas a consumo de serviços e produtos através da internet. Esse decreto ficou conhecido como a Lei do E-commerce, e, um dos temas tratados é o direito de arrependimento.
Mas uma coisa é certa, nenhuma dessas duas leis consegue prever com clareza como o empresário e o consumidor devem agir para que o direito de arrependimento seja atendido e, ao mesmo tempo, não vire um mecanismo de abuso em casos de má-fé.
A verdade é que a lei sempre vem depois. Depois do problema, depois do judiciário já ter resolvido a questão, e depois do problema já ter até mudado. Assim, está sempre um passo atrás.
No e-commerce isso é sentido com força total – nem o judiciário consegue estar atualizado, porque as coisas mudam mais rápido do que correm muitos processos.
Quando o direito de arrependimento foi criado, estavam pensando em telefones e nas vendas por catálogos – aqueles que a vendedora tem lá no salão, que a filha da vizinha traz uma vez por mês e a gente pode escolher os produtos na revistinha, sabe?
Como eram impressos, os catálogos tinham pouco espaço para descrever adequadamente todas as informações dos produtos. Por telefone, menos informações ainda. Assim, muitas pessoas acabavam comprando com uma ideia errada, ou até mesmo eram induzidas a comprar e, em seguida, se arrependiam.
E foi com esse contexto que nasceu o direito de arrependimento.
Com as vendas online, esse direito tomou proporções monstruosas sem passar por qualquer ajuste nas leis. O direito de arrependimento virou um grande ponto de conflito entre comércios e clientes.
Isso não significa que esse direito deveria deixar de existir – pelo contrário – parabéns aos comerciantes que cumprem com esse direito e até já deixam claras as orientações de devolução nas suas políticas e na entrega – é esse mesmo o caminho.
Mas, ao mesmo tempo em que este direito cresceu imensamente, os comerciantes passaram cada vez mais a encontrar questões nebulosas sobre isso.
Como funciona o direito de arrependimento de acordo com Código de Defesa do Consumidor
Muitas pessoas entendem, de forma equivocada, que o direito de arrependimento permite o teste do produto e desistência do mesmo em qualquer hipótese, o que não é verdade.
O direito de arrependimento foi previsto para que o consumidor tenha na compra online, por telefone ou por catálogo a mesma experiência que um consumidor que vai na loja. Por isso, assim como o consumidor na loja não pode passar um desodorante, tirar um pouco de farinha do pacote ou usar um depilador, ao exercer o arrependimento o consumidor deve entregar o produto no estado em que recebeu – se lacrado, inclusive com o lacre.
Isto porque o Código de Defesa do Consumidor autoriza a desistência da contratação, e não do produto em si.
Embora existam interpretações equivocadas sobre isso, elas vêm, cada vez mais, sendo corrigidas pela Justiça, inclusive determinando que a devolução do valor pago sofra o abate da perda de valor causada pelo uso ou por dano causado no produto.
Alguns casos deixam dúvidas sobre a aplicação desta regra – compra de móveis planejados, produtos feitos sob encomenda, produtos personalizados, produtos consumíveis e outros.
Ainda existem os consumidores e concorrentes maliciosos, que realizam compras já pensando em exercer o direito apenas para a empresa ter o prejuízo nas remessas.
É importante lembrar que o consumidor deve manifestar sua intenção de desfazer o contrato em até 7 dias da contratação ou do recebimento do produto, e que se o produto for devolvido por defeito o direito é outro, pois o comerciante e fabricante tem prazo de 30 dias para tentar consertar o produto antes de ter de entregar um novo.
Esse prazo é contado em dias corridos e a manifestação pode se dar por qualquer forma de contato, mas, as formas escritas são sempre mais recomendadas, seja por e-mail ou mesmo por chat e WhatsApp.
Vale lembrar que mesmo que a empresa não tenha uma política de atendimento omnichannel, qualquer meio de contato do consumidor pode ser considerado válido para este fim, então é preciso um ajuste de condutas e uma política de devoluções muito clara para evitar problemas neste ponto.
Também é preciso lembrar que a empresa vai devolver o valor mas o consumidor tem a obrigação de devolver o produto, por isso é praxe que o estorno seja realizado quando do recebimento do mesmo de volta, sendo que cabe à empresa arcar com as despesas dessa devolução.
Estas e novas questões sobre o exercício de direito de arrependimento são enfrentadas constantemente pelos advogados responsáveis pelos e-commerces, que criam modos de demonstrar ao judiciário as diferenças entre o exercício do direito pelos consumidores e os abusos que surgem e causam prejuízos.
Com isso, é possível criar, paralelamente, formatos de operação que minimizem a busca dos consumidores por este direito e, ao mesmo tempo, políticas de trocas e devoluções que deixem claras as regras para que o consumidor possa entender seus direitos e como agir em cada caso.
[…] O exemplo clássico disso é o papel higiênico comprado para uso dos funcionários, a manutenção do ar condicionado da empresa, o cafezinho para uso interno – todas relações de consumo, em que, apesar de empresa, é destinatária final dos produtos/serviços. […]